Os exemplos aduzidos por Napoleão Mendes de Almeida no seu Dicionário de Questões Vernáculas não apresentam o verbo parecer flexionado na 1.ª e na 2.ª pessoa do singular e do plural.
Uma vez que procurei em diversas gramáticas exemplos nas pessoas mencionadas, dentre elas, na d[e] Mira Mateus [Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial caminho, 2003], desejava saber se vocês poderiam aduzir exemplos de autores portugueses que construíram esse verbo na 1.ª e na 2.ª pessoa do singular e do plural com infinitivo [...] não flexionado, como, nestes exemplos: «Eu pareço querer mudar o mundo.»; «Tu pareces agir como Bacharel de Cananeia.»
Por último desejava ainda saber se esse emprego é lídimo português ou se é já brasileiro, [e]m razão de as [...] completivas equivalerem a «Eu pareço que quero mudar o mundo» [e] «Tu pareces que ages como Bacharel de Cananeia». Não haveria porventura um engano, já que o pronome eu não é sujeito de pareço, mas de quero, de querer, da mesma maneira que o tu não é sujeito de pareces, mas de ages, de agir.
Mais uma vez os meus agradecimentos ao vosso trabalho, de que tanto o Brasil precisa.
Carlos Góis [1881-1934], no seu livro Sintaxe de Regência, estabelece distinção entre os verbos impessoais e os unipessoais. Transcrevo para aqui o que ele refere:
«1- Não se confundam Verbos Impessoais com Verbos Unipessoais. A lamentável confusão (em que não poucas gramáticas têm incorrido) provém de que:
– tanto uns como outros só se conjugam em uma pessoa – A TERCEIRA (DO SINGULAR, OU DO PLURAL), donde ser lícito concluir:
– os verbos impessoais são sempre unipessoais.
Os unipessoais, porém, não são impessoais, porque o seu sujeito não é "indeterminado" (como sucede aos impessoais): é sempre determinado e expresso na frase, constituído:
a) ora por um infinitivo, ex.: "Convém estudar" – "Releva dizer" – "Sucedeu-lhe sair" – "Aconteceu-me falar";
b) ora por uma oração (cláusula substantiva subjetiva): "Convém que estudes" – "Urge que saias".»
Por último, transcrevo ainda o que ele menciona no item 4:
«4- Há uma tendência moderna (em que é manifesta a nefasta influência da sintaxe francesa) dos gramáticos em equiparar os verbos unipessoais aos impessoais, partindo do princípio de que:
Quer o infinito, quer a oração (únicos sujeitos que pode ter o verbo unipessoal) "não constituem propriamente pessoas gramaticais).
Ora, sendo Pessoas Gramaticais – as diversas maneiras de ser do sujeito, segundo a definição clássica – é certo que os casos de sujeito infinitivo e de sujeito oracional se enquadram na definição. Enumerando as diversas "relações", que podem funcionar como sujeito – são acordes as gramáticas (entre as quais sobre-eleva a de Mason) em arrolar o infinitivo e a oração. Ora, se equipararmos os verbos unipessoais aos impessoais, iremos cair no absurdo de considerar o infinito e a oração como seu objeto direto, o que poderá estar perfeitamente conforme ao génio da língua francesa, mas não no está em relação ao génio da portuguesa. É inacreditável que gramáticos do porte de Epifânio Dias [18841-1916] e João Ribeiro [1860-1934] pretendam inaugurar semelhante teoria, partindo de uma acepção muito restrita, em que estimam o acidente de pessoa, parecendo que só admitem como pessoa gramatical o "pronome" e o "substantivo" - esquecidos de que o infinito é um substantivo verbal, e de que orações há substantivadas, equivalentes do substantivo (segundo o testifica Mason), e de que o pronome, quando indefinido, é ainda mais vago e impreciso em sua enunciação pessoal que o infinito e a oração. Ouça-se o que aduzem a respeito: Epifânio Dias, em sua Sintaxe Histórica: "Em sentido lato também são impessoais as orações cujo predicado se refere a uma oração que faz as as vezes de sujeito (v.g. importa que isto se faça depressa), por isso que uma oração não é propriamente uma pessoa gramatical."»
Pois bem, tendo procurado em várias gramáticas portuguesas, não encontrei nenhuma distinção feita pelos autores entre os verbos impessoais e os unipessoais e por isso mesmo gostaria de saber se a diferença que Carlos Góis estabelece se encontra noutros autores de gramáticas portuguesas ou se se trata de uma teoria sua. Em havendo, gostava ainda de que me informassem o autor ou os autores que perspectiva(m) esses verbos da mesma maneira que o sr. Góis.
Trabalho maravilhoso o vosso.
Desde já muito obrigado!
P. S. : Ainda sobre a minha pergunta, desejava saber se a ação dos verbos unipessoais se atribui só a vozes de animais, se se trata unicamente de vozes de animais, por exemplo, rugir (leão), bacorejar (leitão), tinir (milheira) [...] Ou se o que sr. Carlos Góis aduz é um corolário seu, uma formulação da sua lavra, quando diz que os verbos impessoais são sempre unipessoais e que os unipessoais, no entanto, não são impessoais, porque o seu sujeito não é indeterminado, como sucede aos impessoais, sendo, portanto, sempre determinado e expresso na oração, constituído, ora por um infinitivo («Convém estudar»), ora por uma oração («Aconteceu-me faltar»), ou, se essa visão existe também em Portugal, na tradição gramatical portuguesa. [...]
N[um] enunciado como «Agora ele tem vivido em Coimbra», podemos apreciar o valor aspetual iterativo ou imperfetivo?
Já li, nas vossas respostas, que os dois valores básicos são o perfetivo e o imperfetivo e que os outros – habital, iterativo e genérico são situações –, mas cada manual e cada gramática dão a sua explicação e os seus exemplos para configurar os vários valores aspetuais (que são sempre os mais flagrantes) e não consigo encontrar um consenso.
Assim sendo, os enunciados construídos com complexos verbais como «tens vivido» ou até no pretérito «tinhas feito» configuram sempre o mesmo valor aspetual ou depende do contexto específico de cada frase?
Grata,
Na frase «Oxalá que eles pudessem dizer mais qualquer coisa», configura-se uma modalidade apreciativa? Oxalá, que exprime desejo, pode ser tido como um juízo de valor?
E, dado que o verbo está conjugado no pretérito imperfeito do conjuntivo, não podemos também considerar válida a presença da modalidade epistémica com valor de probabilidade?
Grata.
Gostaria de saber se, nas orações temporais com quando, só é possível utilizar o futuro do conjuntivo ou é também possível usar o presente do conjuntivo, por exemplo: «quando chegares, passa por cá». É também possível dizer «quando chegues, passa por cá», ou isto é incorreto?
Poderiam recomendar-me alguma gramática em que apareçam as conjunções temporais, concessivas, temporais etc. e o tempo verbal que tem de ser utilizado com cada uma delas?
Muito obrigada e parabéns pelo site!
Gostava de saber o que são verbos paradigmáticos e qual a melhor forma de eles serem ensinados aos alunos.
Obrigada.
Porque é que nesta frase o discurso indireto é feito desta forma?
«... a gente começou a conversar sobre a festa e ele disse-me que quando me ouviu a falar ... »
Porque «ouviu», e não «ouvira»? Ou «quando te tinha ouvido a falar»?
Esta frase causou muita confusão aos alunos, e eu também fiquei um pouco confuso. As regras são claras, mas aqui fugiu um pouco às regras.
Muito obrigado
Eu sei que o substantivo masculino esmero se pronuncia com a sílaba tónica -me- com um e fechado: como se fosse "esmêro". Mas qual é a pronúncia da primeira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo esmerar? Será «eu esmero-me», com a sílaba tónica pronunciada com um e aberto, como em "esméro"? Ou será «eu esmero-me», com a sílaba tónica pronunciada com um e fechado, como em "esmêro"?
Desde já, mui grato pela atenção despendida.
Creio que o futuro é um composto do infinito do verbo que se está a conjugar com o verbo haver. Assim sendo, como se explicam as formas do plural?
Compreende-se que o verbo chover tenha as suas limitações com referência às conjugações nas diferentes pessoas. Todavia não o compreendo para o verbo aprazer. Quer o Priberam, quer a Porto Editora, registam apenas as terceiras pessoas do singular e do plural. Não estará correto, portanto, referir "apraz-me"? Qual a denominação para este tipo de verbos? Não é este verbo sempre reflexivo?
Obrigado.
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